Curupira


Corpo de menino — de curu, abreviação de curumi e pira, corpo. O curupira é a mãe e o pai do mato, o gênio tutelar da floresta que se torna benéfico ou maléfico para os frequentadores desta, segundo circunstâncias e o comportamento dos próprios frequentadores.

Figuram-no como um menino de cabelos vermelhos, muito peludo por todo o corpo e com a particularidade de ter os pés virados para trás e ser privado de órgãos sexuais. A mata, e quantos nela habitam, está debaixo da sua vigilância. É por via disso que antes das grandes trovoadas se ouve bater nos troncos da árvores e raízes das samaumeiras para certificar-se que podem resistir ao furacão e prevenir aos moradores da mata do próximo perigo.

 a sua guarda direta está a caça, e é sempre propício ao caçador que se limita a matar conforme as próprias necessidades. Ai de quem mata por gosto, fazendo estragos inúteis, de quem persegue e mata as fêmeas, especialmente quando prenhes, quem estraga os pequenos ainda novos! Para todos estes o curupira é um inimigo terrível. Umas vezes vira-se caça que nunca pode ser alcançada, mas que nunca desaparece dos olhos sequiosos do caçador, que, com a esperança de a alcançar, deixa-se levar fora de caminho, onde o deixa miseravelmente perdido, com o rastro por onde veio desmanchado. Outras, o que é muito pior, o pobre do caçador alcança a caça, até com relativa facilidade, e a flecha vai certeira embeber-se no flanco da vítima, que cai pouco adiante, com grande satisfação do infeliz. Quando chega a ela, porém, e vai para a colher, em lugar do animal que tinha julgado abater, encontra um amigo, o companheiro, um filho, a sua própria mulher.

Os contos de caçadores vítimas do curupira são contos de todos os dias no meio indígena dos moradores tanto do rio Negro como do Solimões, Amazonas e seus afluentes.




(Em Cascudo, Luís da Câmara. Antologia do folclore brasileiro. 2ª ed. São Paulo, Livraria Martins, 1954, v.2, p.351-352), organização Ermano de Stradelli.
DESENHO:Walmor Corrêa
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